13.03.09

No Cibertúlia li este comentário que me levou a ler esta noticia...

 

Como não existem comentário possiveis da minha parte á noticia, se é que assim se pode chamar passo a postá-la na integra para que percebam.

Peço-vos que leiam os comentários feitos á noticia para perceberem a amizade.

 

"O camarada João Mesquita

O João foi um dos homens sérios que conheci. Não conheço assim tantos, infelizmente. Foi sério até à sua própria exaustão, prejudicou-se de ser sério, foi inflexivelmente sério. O João foi um dos homens de carácter que conheci.

Morreu o jornalista João Mesquita. Morreu o amigo e camarada que me acompanhou e que eu acompanhei desde os meus 17 anos. Primeiro numa luta juvenil contra a ditadura e a guerra colonial e por uma revolução impossível com uma ideologia esquerdista e irresponsável; depois, a partir do momento em que ambos rondávamos os 20 anos, no estágio e no primeiro emprego como jornalistas e, mais tarde, na direcção do Sindicato; por último, como profissionais, como homens com ideias diferentes, mas cumplicidades imensas. Como homens, que se respeitam como homens livres.
O João foi um dos homens sérios que conheci. Não conheço assim tantos, infelizmente. Foi sério até à sua própria exaustão, prejudicou-se de ser sério, foi inflexivelmente sério. O João foi um dos homens de carácter que conheci. Um carácter amistoso de bon vivant à mistura com uma humildade republicana e laica de revolucionário. O João era uma contradição, daquelas boas contradições que nos dizem que um ser é tão livre que derrota as prisões e os preconceitos. Não seria possível compreender inteiramente o João sem entender o seu percurso, uma vez que toda a sua vida breve (faleceu com 51 anos) foi feita de amizades e cumplicidades que o marcaram, ao mesmo tempo que de acções suas que marcaram os que o foram rodeando.
Comecei a trabalhar no mesmo dia e no mesmo jornal - 'A Voz do Povo' - que o João Mesquita. Aliás fôramos os dois convidados, após o jornal romper com a UDP, para reforçar os quadros redactoriais. Experiência? Tínhamos a do Movimento Associativo. Andáramos os dois a fugir da polícia (e a ser uma vez presos por ela) e a fazer conspirações mais ou menos pueris - de que fizeram parte a tentativa de raptar um informador da PIDE no movimento estudantil, ou a libertação de um estudante preso, comité onde ambos servimos às ordens de Nuno Crato. O Director do Jornal era, na altura, João Carlos Espada, que o comandava com 24 anos, e os chefes de redacção eram José Manuel Fernandes e Nuno Pacheco. Somos todos amigos, hoje, e sei bem como todos sentimos a morte do João.
Claro que o jornal faliu. Mais tarde, consegui um emprego na delegação em Lisboa de um vespertino do Porto, propriedade do 'Jornal de Notícias' - o 'Notícias da Tarde'. Passados uns meses, quando soube que o meu chefe - e mestre da tarimba, Fernando Antunes - , precisava de um repórter parlamentar, propus-lhe o Mesquita. Ele desempenhou essas funções com qualidade e originalidade e penso que foi aí que, verdadeiramente, ele foi reconhecido como bom e sólido jornalista que foi.
Passámos ambos para o 'Jornal de Notícias', de onde eu segui para 'O Jornal' e ele, anos depois, para o 'Público'. A sua carreira passou, ainda, pelo 'Independente' e por colaborações em diversos jornais, as últimas das quais aqui no Expresso, onde ainda há um mês (14 de Fevereiro) publicara um texto no Actual. Hoje mesmo, iria fazer uma reportagem para o mesmo caderno...
Fui também eu que propus ao José Pedro Castanheira o nome do João Mesquita para a Direcção do Sindicato. O João entrou como secretário e foi exemplar. Nessa época, como, anos depois, nos tempos em que ele próprio foi o presidente do SJ, o Sindicato ainda era uma força independente e irreverente comandada por jornalistas. O João, que presidiu de 1989 a 1993, vinha de uma tradição de presidentes como Cáceres Monteiro, Cesário Borga, José Pedro Castanheira, que conferiam respeitabilidade e responsabilidade à associação, muito longe da burocracia de jornalistas cinzentos em que se tornou hoje em dia.
O João não pensava como eu, nunca o escondemos um ao outro. Mas era tolerante como só pode ser tolerante quem vinha de uma família que pensava o contrário dele. Nascido em Coimbra (e exaltado adepto da Briosa, tendo escrito uma excelente história da Académica), veio cedo para Lisboa e, ainda rapazes, em casa dele, via coexistirem os posters de Mão Zedong com cartazes de Freitas do Amaral (o seu irmão era feroz apoiante do recém-criado CDS). O seu pai, o já falecido Conselheiro Costa de Mesquita, chegou a ser do Tribunal Constitucional, indicado pelos centristas. Mas nada disto atrapalhava o João, nem as minhas 'reaccionaradas', como ele lhes chamava. 'És um reaccionário porreiro', disse-me ele há uns anos... E eu respondi-lhe 'E tu és o melhor esquerdalho do mundo'.
Dávamo-nos bem. Éramos amigos, profundamente amigos, e hoje só lamento o tempo que tive para estar com ele e não estive, a possibilidade que tive de falar mais com ele e não o fiz.
A vida e a família (o João era casado com Clara Vasconcelos, também jornalista, e deixa uma filha com 10 anos) afastaram-nos, mas nunca quebraram os laços solidários dos conspiradores juvenis.
A morte tenta cortar esse nó, mas eu, que ao contrário do João sou crente, tenho esperança de ainda o encontrar algures.
Deus gosta muito mais de pessoas como o João, do que daqueles que apenas sabem utilizar o seu nome para pedir desculpa pelo mal que fazem aos outros.
E o João nunca, mas nunca, fez mal a ninguém. Pelo contrário, deixa um rasto de amigos em todas as latitudes possíveis.
 Noticia retirada do jornal online Expresso, escrita por Henrique Monteiro"

 

 

Quando morrer quero que os meus amigos falem assim de mim...

sinto-me: sensibizada
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Desabafado por Guitinha às 00:08

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